Receita deve liberar compensação fiscal
As unidades da Receita Federal do Brasil devem cumprir as decisões judiciais que liberam o uso de créditos tributários para o pagamento de outros tributos "em seus exatos termos".
Laura Ignacio
As unidades da Receita Federal do Brasil devem cumprir as decisões judiciais que liberam o uso de créditos tributários para o pagamento de outros tributos "em seus exatos termos". Isso é o que determina uma solução de divergência emitida pela Coordenação-Geral do Sistema de Tributação (Cosit), órgão da Receita que orienta os fiscais do país inteiro. A solução é relevante porque, segundo especialistas, é comum os postos regionais da Receita rejeitarem pedidos de compensação de créditos por interpretarem decisões judiciais de maneira diversa da feita pelos juízes. "Há que ser respeitada a interpretação dada à lei pelo Poder Judiciário", estabelece a Solução de Divergência nº 38, de 3 de novembro de 2008, que refere-se a decisões judiciais finais, contra as quais não cabem mais recursos. Advogados afirmam que a orientação da Cosit pode fazer com que não seja mais necessária uma segunda ação na Justiça para pedir o cumprimento da primeira, situação comum, segundo eles.
Na prática, contribuintes que apresentaram decisões judiciais finais que ordenaram a liberação de créditos tributários à Receita, mas cuja liberação foi negada, podem agora usar a orientação da Cosit como jurisprudência em ações judiciais contra os postos fiscais que negaram os pedidos. O advogado Régis Palotta Trigo, do escritório Demarest & Almeida Advogados, já defendeu na Justiça, por exemplo, um contribuinte que teve um pedido de habilitação de créditos de PIS para posterior compensação negado porque a Receita interpretou que, ao contrário do que disse a decisão judicial final, o crédito em questão estaria prescrito. "O contribuinte tem cinco anos, a contar do julgamento final da decisão, para habilitar o crédito", diz.
No Rio de Janeiro, em Porto Alegre e em São Paulo, o escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados identificou casos em que contribuintes obtiveram decisões finais que liberaram o uso de créditos e, no momento das habilitações, tiveram seus pedidos de compensação negados. O advogado Paulo Rogério Sehn, sócio da banca, afirma que, em um dos casos, o contribuinte tinha uma decisão final a favor do aproveitamento de crédito-prêmio de IPI acumulado por conta de exportações realizadas no passado e fez a compensação. "A operação não foi aceita pela Receita com base na Lei nº 11.051, de 29 de dezembro de 2004, que vedou este tipo de crédito", diz o advogado. Para conseguir compensar, Sehn teve que voltar ao Judiciário, onde alegou que a decisão que libera o direito ao crédito havia sido proferida antes da entrada em vigor da legislação. "Como o caso envolve milhões de reais, a União ingressou com uma ação rescisória e obteve liminar. Mas acreditamos que no mérito ganharemos", diz.
A postura da Receita colabora para aumentar o gargalo no Poder Judiciário, segundo o advogado Marcos Paiva, sócio do escritório Choaib, Paiva e Justo Advogados. Isso porque, segundo ele, depois de levar até sete anos para terem seus pedidos de compensação aceitos pelo juiz, os contribuintes precisam recorrer novamente à Justiça para fazer com que a Receita cumpra a ordem judicial. "O que pode levar mais três ou quatro anos", calcula.
Com a publicação e divulgação da solução de divergência, a advogada Daniella Zagari, do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, acredita que o contribuinte não precisará mais recorrer à Justiça para ver reafirmada a decisão já proferida a favor da compensação. "O Poder Judiciário é soberano. Há vários precedentes no sentido de que ordem judicial não se interpreta, se cumpre", diz a advogada.
A solução se tornou mais polêmica porque foi editada no mês de novembro, quando o governo propôs a aceleração da liberação de créditos tributários como uma das medidas de combate à crise econômica - pois isso aliviaria o caixa das empresas. Mas, segundo o procurador-geral adjunto da Fazenda Nacional, Fabrício Da Soller, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não foi chamada para participar da medida, que deverá abranger apenas os créditos extrajudiciais.
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